domingo, 20 de dezembro de 2009

Pobre vaidade

I
Ela tinha o caminhar leve dos alcoólatras.
Uma estreita faixa rubra de batom seguia
se alastrando na boca sem dentes: vazia.
mas sorria ainda, com o sorriso dos hipócritas.

Na alma, moribunda e maltrapilha, a desgracença
nos poros, absorvia a ciência trágica do dia
e no peito, dessa louca, que outrora vadia
fazia assim: um olho na vida, e outro na descrença.

Essa amante dos sibaritas, levou nas costas um peso -
Uma corcunda horrenda e a falta de alguns inúteis dedos.
E na boca uma estreita faixa de batom avermelhado,

com o rosto deformado e as vestes em retalho
engolindo a ânsia d'um coração cuspindo escárnio,
via-se ainda um orgulho de quem já tinha amado.

II
Correspondia a todos os olhares das ruas...
Olhava, sorria, e o peito inchava de orgulho.
Com o sorriso murcho de novo, voltava ao entulho.
E no monturo, que se encontrava, estava ela, nua.

Sobre o reflexo solar: que é a lua, lavava-se.
retirava as lepras e escárnios do dia imundo.
Mas na boca permanecia ainda o batom rubro
e no olhar o sorriso de posse da vaidade.

Encerrava-se em si mesma, como inseto morto.
vivendo, assim: a noite gente e de dia estorvo.
e ainda ouvindo gracejos, tais, -"Puta!", "puta"...

Oh! Senhora, ser dos sonhos monstruosos,
ainda assim infla o peito de amores incestuosos...
e sorri ainda para os pobres que te insultas.