sexta-feira, 21 de maio de 2010

De quando troco a pele

Ah! a chuva são como gotas ácidas na alma.
E como cobra que troca a pele eu troco-a.
É a renovação epidérmica que exala
a continuidade descontínua da alma.

Meu fragilíssimo envoltório abstrato
troca-se conforme troco de paisagem.
o corpo, esse asco, é só um substrato
de toda convenção sensorial da visagem.

A chuva renova, troca todo ar imundo
e felicita minh'alma à muda epidérmica
me faz ouvir surdo e falar mudo.


É que lava as impurezas essa chuva.

e si chove? ah! se chove...

estou pronto para a segunda muda.










quarta-feira, 31 de março de 2010

IV

Se instala nas entranhas,
Criatura linda e indefesa,
que se fez em natureza ígnea
qual a morada de tua beleza.

de Sabedoria ignota, sem face.
se formando em placenta, nasce.
virtuoso, visionário, há espreitar-me.
sentia mesmo sem ver, olhar-me.

penso em um dia dizer: - Ó! meu filho,
segues o teu pai e mãe, assim,
como João e Maria, segue o milho.

Esse poema que nasce dos meus dedos
tu que nasce de minha mulher em nervos.
Nós, meu filho, te livraremos de todos os medos.

terça-feira, 16 de março de 2010

Faminto

Negarais a todos uma esmola...
Essa antropofagia etílica
da natureza que o homem esfola
revela-se monstruosa e cínica.

Aos homens enfurecidos
não mais oferece o pão
nem que p'ra isso fiquemos convertidos.
Nem que p'ra isso se peça perdão.

No esvaporido suor, no escaldo sanguinio.
Nem mesmo a visão de Constantino
desmentia, tais teorias ancestrais.

- Faminto morre o homem.
a natureza se eleva à fome
e ele recupera-se nunca mais.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A Tristeza do Número

Um, dois, três, quatrilhões...
presos aos ossos do matemático
castigando a fé desse reumático
nos braços, dedos, cabeça como grilhões.


Mortes, orgias, - catastroficissima solidão -
fabricando a fantasmologia da contagem
catando, contando... inúmera contagem.
Só existo se em registro um numero me dão


se um dia me tirassem esse número.
perceberia que unicamente estamos
vivendo a alegoria da vantagem.


mas vejo somas, subtrações no útero
e sinto que só existiríamos
se entrassemos nessa triste contagem.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Bom tempo

Temporalmente não chovo,
nem meus dias são claros,
sigo sempre assim, nublado,
parcialmente nublado.

Minha tarde não é calorosa
nem tem de usar agasalho
ela é assim, um leve mormaço
um claro e sombrio mormaço.

Minha noite não é estrelada...
possui muitas nuvens,
alta carga positiva e negativa,
geradora de relampejantes idéias.

Sou assim: Dia nublado,
com um caloroso mormaço
com noites escuras, coriscos...
à intensidade de um tempo perturbado.

sábado, 9 de janeiro de 2010

A consciência

Minha fantasia é absurda...
Esse inseto que consome e regurgita
as mais insanas possibilidades de vida
e as putrefações em dia umido visita.

Visita a umidade abaulada do meu quarto
e põe-me a perceber a figura desse rastro.
Castigando as eras fantasmagoricas dessa visagem
a sentir ânsias, absurdamente, vi uma miragem

catequizando meu intestino, convertendo-o.
Inseto imundo que transcende as eras ao relento
vinha me despertar d'um fantastico intelecto.

Este que fermenta e alcoolisa, vibrações inatas
brota de semente em semente de radiotivas fontes
atravessando pontes imensas com forças incógnitas.

Augusta Ladainha

A Augusto dos Anjos

Cantou ao tamarindo de sua vida,
sonetos da putrefação do homem
no âmago intestinal que o consolida
dizia coisas que por dentro consomem.

Me vi junto a vermes, corvos, carneiros...
seguindo um fantástico caixão,
Celebrando a chegada do poeta coveiro
que cavava dos sepulcros a bela Canção:

"Foi assim como na sua profecia:
morreu aos trinta de pneumonia.
Enfermo, então veio a perecer.

Mas o contrario de teu corpo, poeta,
aquém dedico minha Litania,
os teus versos hão de nunca apodrecer."